Justiça

Conferência debate a infraestrutura na ótica constitucional

Vitória (ES) – O painel 2 da IV Conferência Internacional de Direito Ambiental da OAB, abordou aspectos da infraestrutura do setor. A mesa foi presidida por Samir Murad, presidente da Comissão de Meio Ambiente da OAB-MA; teve como relator Marcos Delfino, membro da Comissão da OAB-ES; e foi secretariada por Gabriel Totola Fontana, que também integra a Comissão capixaba.

A primeira expositora foi Flávia da Costa Limmer, professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), que falou sobre gás de fontes não convencionais. “Sustentabilidade é um caminho longo. Precisamos de recursos para atingi-la, sem negar que petróleo e gás são essenciais à economia do Brasil. A grande greve recente mostra isso, a nossa dependência desses produtos. O Ministério de Minas e Energia coloca que temos uma matriz de energia limpa, o que é uma verdade parcial. Sim, o Brasil é um dos países com mais energia hidráulica no mundo. Entretanto, 39% da nossa base energética está em petróleo e gás dele derivado. Somos o 15º colocado em reservas deste recurso no mundo”, apontou.

A professora abordou bastante a temática do shale gas (gás não convencional ou de folhelho). Segundo dados da International Energy Agency (IEA), o Brasil tem 244,9 trilhões de pés cúbicos do recurso, dentro de um contexto global de 7.576,6 trilhões de pés cúbicos, com 418,9 bilhões de barris a serem explorados no mundo. Flávia falou ainda sobre as vantagens do uso da metodologia do faturamento hidráulico na extração do shale gas – como uma provável autossuficiência brasileira – e de desvantagens como o aumento crítico da probabilidade de abalos sísmicos.

Enquanto perspectivas no Brasil, citou o Programa Gás para Crescer (elencado no PL 6403/13) e o Programa Reate (Revitalização da Atividade de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural em Áreas Terrestres), de 2017.

Insegurança jurídica

A desembargadora federal da 3ª região, Consuelo Yoshida, falou a respeito dos conflitos e fez uma reflexão sobre incertezas e inseguranças jurídicas que permeiam a área ambiental. “Não adianta lei complementar 140 ou nova lei de licenciamento que não vão evitar a judicialização do tema e os conflitos. A origem disso está lá na base e tem muito a ver com semiótica, o uso de expressões que chamamos de conceitos jurídicos ou conceitos legais indeterminados, e por outro lado a necessidade de preenchimento de critérios técnicos”, disse ela em referência à lei que fixa normas para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativas à proteção do meio ambiente.

Ela chamou a atenção para uma responsabilidade compartilhada no sentido de construir condições para diminuir os conflitos. “Temos uma grande responsabilidade, Legislativo, Executivo e Judiciário, e funções as essenciais da Justiça, como a advocacia, o Ministério Público e a Defensoria Pública, para tentar reduzir esses conflitos que chegam no Judiciário e, às vezes, de forma desnecessária. Até porque o Judiciário não é o foro adequando para discutir muitas dessas demandas”, declarou ela, destacando que o debate em fórum equivocado leva a flexibilização já de uma lei geral, a exemplo do que aconteceu, segundo ela, com o Código Florestal.

Consuelo defendeu como objetivo no debate um meio termo, entre o que chamou de “ótimo ambiental”, meta de ambientalistas e de acordo com ela, defendida tradicionalmente pelo Ministério Público, e aquilo que vai na direção diametralmente oposta, da linha desenvolvimentista. “O certo é o caminho do meio e isso definiremos caso a caso e com estudos técnicos que não sejam parciais. Se forem parciais, seja do Ministério Público, seja dos advogados que representam o empreendedor, o juiz fica vendido”, disse.

Equilíbrio no direito ambiental

Celso Fiorillo, presidente da Comissão do Meio Ambiente da OAB de São Paulo, abordou a questão do direito ambiental em um contexto de economia capitalista e como ele é interpretado no Judiciário. “A Constituição de 1988 diz há 30 anos que os bens ambientais existem para ser usados em proveito da população. Em um contexto de economia capitalista, este uso tem enfrentamento natural entre os empresários, que querem sempre ter lucro, e a população, que muitas vezes não está volta apenas ao lucro. Assim nasce o direito ambiental”, afirmou.

“O direito ambiental, ao longo de 30 anos, sofreu dois problemas. O primeiro era a ideia de ser um direito público e administrativo, do Estado, o que é uma farsa. O direito ambiental evoluiu porque mostrou que representa os bens públicos da pessoa humana. Por ter essa importância, assumiu um grande grau de politização e foi, digamos assim, sequestrados por uma visão ideológica. É como se houvesse um direito ambiental do bem e um do mal. Além de patético, isso é inconstitucional”, disse.

Para Fiorillo, graças à advocacia existe o direito ambiental brasileiro. Segundo ele, os temas nascem do sistema constitucional, sofrem embates diante do uso dos empresários, que são movimentados por ações que o Ministério Público propõem. “Exatamente pelas circunstâncias de o direito ambiental ser preponderantemente constitucional, o Supremo Tribunal Federal tem sido o grande intérprete da área, acima das outras cortes. Ele fixa as visões, como, por exemplo, que direito ambiental não é apenas flora e fauna, aborda questões como saúde e cidades”, explica.

Segundo o advogado, outra questão fixada pelo STF é que, ainda que haja uma ordem econômica para capitalistas, é também um capitalismo civilizado. “Não é porque você é um empreendedor que pode fazer o que quiser. Mas a recíproca também é verdadeira: não tem que ser colocado na cadeia só por ser empreendedor. É um direito equilibrado, que enfrenta os percalços e vai firme e seguro por mais 30 anos de Constituição”, diz.

“Como tudo na vida, é bom que haja o equilíbrio. Passamos por fase muito tumultuada, fruto de uma sociedade em que todo mundo dá palpite sobre tudo. Caetano Veloso dando opinião sobre direito ambiental, as coisas mais desbaratadas. No campo jurídico, o que vale é o que a lei aponta. E lei aponta um sistema de equilíbrio”, finalizou.

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