Justiça

Escolas e universidades sugerem mudanças na seleção de juízes

Com o objetivo de reunir subsídios e repensar o modelo estabelecido para a seleção de magistrados na Resolução nº 75/2009, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) realiza nesta segunda-feira (10/06) uma audiência pública para debater o tema. Universidades e escolas de formação de juízes estão entre as entidades selecionadas para apresentar propostas à revisão da norma. Sugestões para aumentar a representatividade e a inserção de profissionais mais experientes foram alguns dos itens destacados durante a audiência pública.

De acordo com a juíza federal Cíntia Menezes Brunett, que representou a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) no evento, a seleção de candidatos ao cargo de juiz precisa ser estruturada de forma que a avaliação para o ingresso vá além da simples aferição de conhecimento. A maior preocupação da entidade está relacionada com representatividade.

“O curso de aperfeiçoamento durante o concurso não beneficia a diversidade social, de gênero e de raça. Por causa de dificuldade financeira ou pessoal, existem indivíduos que não conseguem buscar a magistratura e isso nos preocupa. A nossa posição é por um concurso com diretrizes claras para seleção de juízes alinhados com as expectativas da sociedade e um curso de formação inicial forte após o ingresso, inclusive, com uma etapa nacional e uma avaliação precisa ocorrer durante o processo de vitaliciamento”, destaca a juíza.

A representatividade também é uma preocupação da Associação dos Juízes pela Democracia (AJD). Para Claudia Maria Dadico, conselheira da entidade, o concurso tem que objetivar selecionar o juiz que o povo brasileiro necessita, ou seja, aquele que vai cumprir os objetivos traçados na Constituição Federal de 1988. A associação apresentou as suas contribuições em três eixos: a composição das bancas, os conteúdos e os procedimentos afetos a transparência e a impessoalidade.

“Embora mulheres, negros e pardos representam mais metade da população brasileira, tal composição não se reflete na nossa magistratura. Dados do Perfil Sociodemográfico dos Magistrados Brasileiros elaborado pelo CNJ em 2018 destacam que as mulheres representam 38% da magistratura. No que se refere ao perfil ético racial apenas 18% se declararam como negros e pardos e apenas 1,6% são de origem asiática. Além disso, de um total de 18.168 magistrados ativos, apenas 11 se declaram indígenas”, enumera Claudia.

De acordo com a proposta apresentada pela ADJ, no que diz respeito as composições das bancas, em vez de reserva ou vagas fixas para mulheres e pessoas negras e pardas, o marco normativo a ser construído pelo CNJ pode aplicar metas de diversidade. “Em um primeiro momento, os tribunais seriam obrigados necessariamente a reservar ao menos dois assentos a cada cinco em bancas de concurso, uma para mulheres independentemente da raça, e outro para pessoas negras ou pardas de qualquer sexo”, frisa.

Profissionais vocacionados

Já a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (Enamat) faz quatro sugestões para aprimorar o atual modelo. O primeiro é reformular a prova de títulos, considerando pontuações diversas. A segunda alteração proposta baseia-se na facultividade da inversão de algumas etapas do certame e o terceiro aspecto seria a introdução de um procedimento inteligente de correção da prova dissertativa, resolvendo problemas operacionais e logísticos.

“Precisamos pensar em avaliações que introduzam o raciocínio e a análise crítica com pequenos casos a serem solucionados. Já a última alteração seria a combinação dos títulos para que haja uma nota de corte justa. Por exemplo, se há uma nota de corte dos 300 melhores avaliados, que também sejam considerados os títulos dos 900 mais bem posicionados em determinado concurso. Com essa média, temos condições de valorizar o raciocínio crítico e a experiência profissional do candidato”, considera o assessor da direção da entidade Giovanni Olsson.

O representante da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados da Justiça Militar da União (Enajum), José Barroso Filho, destacou a necessidade de pensar na formação de juízes mais humanos. “Tenho a impressão que os candidatos dão uma grande ênfase na memorização das questões aplicadas, mas perdem o conceito da empatia, da ética, do relacionamento. O juiz do século XXI precisa saber que sua missão é muito especial, ele pode provocar mudanças definitivas na vida de outra pessoa”, pontua.

A percepção do papel do magistrado também foi destacada pelo professor e integrante do Conselho Consultivo do CNJ André Ramos Tavares. “A resolução tem disciplinas obrigatórias estabelecidas e, se estamos propondo mudanças, seria essencial que esse juiz tenha o conhecimento de economia digital. Isso não pode mais ser uma opção, estamos falando da vida do cidadão. Entre as disciplinas, considero também obrigatório o direito econômico, atualmente considerado o direito socioeconômico”.

Competências

Já o coordenador do Laboratório de Gestão do Comportamento Organizacional da Universidade Federal do Pará (UFPA), Thiago Costa, apresentou dados de um estudo que elencou 20 competências de liderança na administração pública. A pesquisa, desenvolvida desde 2011 com mais de 30 instituições do Executivo e do Judiciário, identificou os perfis necessários para as mais diversas funções da administração pública.

Na compilação dos resultados chegou-se as seguintes competências comportamentais: condução de mudanças; autocrítica; marketing institucional; comunicação oral; inovação; empatia, flexibilidade; autocontrole; negociação; relacionamento interpessoal; gestão de conflitos; construção de equipes; delegação; desenvolvimento de equipe; gerenciamento de talentos; inspiração de pessoas; oferecimento de devolutivas (feedback); orientação por resultados; representação e processo decisório.

“Para cada um desses caminhos alternativos são recomendadas leituras, vivências, estágios, dinâmicas, além da atuação em funções distintas para conhecer a realidade daquela unidade. Essas competências são passíveis de serem identificadas, descritas, mensuradas e desenvolvidas e podem ser diretamente avaliadas no quesito aprendizagem, recrutamento e seleção. A sugestão seria confrontar estas alternativas em possíveis competências na área da magistratura e adotar aquelas que o Judiciário entender mais adequado”, frisa.

Douglas Saviato
Agência CNJ de Notícias

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