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Justiça busca maior integração no combate ao trabalho escravo

As investigações de trabalho escravo feitas em todo o país resultaram em 146 processos que tramitam equivocadamente na Justiça Estadual. Pela legislação, explorar trabalho em condições análogas à escravidão é crime federal e, por isso, deveria ser levado a julgamento na Justiça Federal.

Debater soluções para esse e outros problemas causados pela falta de integração entre órgãos que combatem o trabalho escravo é hoje uma prioridade do Comitê Nacional Judicial de Enfrentamento à Exploração do Trabalho em Condição Análoga à de Escravo e ao Tráfico de Pessoas, que esteve reunido na última sexta-feira, no CNJ.

De acordo com a subprocuradora-geral do Ministério Público Federal (MPF), Luiza Frischeisen, uma operação de resgate de pessoas submetidas a trabalho escravo realizada pela Polícia Civil pode resultar na anulação de toda a investigação. “Nesses casos, o delegado tem de remeter a investigação imediatamente à Procuradoria-Geral da República (PGR). Caso contrário, um habeas corpus pode ser pedido com base na anulação das provas. Além disso, a Polícia Federal é que tem expertise em operações dessa natureza”, afirmou a representante do MPF no comitê.

A integração entre as instituições também é necessária para tornar mais eficientes as ações de fiscalização nos locais apontados por denúncias como focos de trabalho escravo, segundo a delegada da Polícia Federal (PF) Gabriela Madrid. “Às vezes, quando chegamos aos locais denunciados, as pessoas que encontramos nos dizem que demoramos a chegar. Em fazendas, logo após o fim a época da colheita, as pessoas submetidas a condições análogas à escravidão costumam deixar o lugar”, disse a delegada da PF.

Sem as testemunhas, torna-se muito mais difícil transformar as denúncias em provas que sirvam à condenação dos responsáveis pelo trabalho escravo. Uma articulação mais precisa entre as instituições que participam desses chamados “grupos móveis” – Ministério do Trabalho, Ministério Público do Trabalho (MPT), PF, Defensoria Pública da União (DPU), Polícia Rodoviária Federal (PRF), além da PGR – e o Judiciário, responsável por emitir mandados de busca e apreensão, ampliaria o número de pessoas libertadas em operações de resgate. Entre 1995 e 2015, foram resgatados cerca de 50 mil trabalhadores em 1.785 ações de fiscalização desses grupos, de acordo com o governo Federal.

Desafios – Mesmo nos casos em que a fiscalização tem êxito, no entanto, provar na Justiça a responsabilidade penal do responsável pelo crime de redução a condição análoga à de escravo impõe a policiais e procuradores outros desafios, um jurídico e outro tecnológico. O primeiro diz respeito à responsabilização dos culpados pelo crime. “Quem está tomando conta dos trabalhadores quase nunca é o responsável. Quem aufere lucro por meio daquele trabalhador é quem deveria ser responsabilizado”, disse a subprocuradora-geral do MPF, Luiza Frischeisen.

Interação – O segundo desafio envolve a integração dos sistemas eletrônicos de tramitação processual dos diferentes órgãos do sistema de Justiça. Tribunais, Ministério Público e Defensoria Pública utilizaram sistemas próprios, o que prejudica o andamento das ações judiciais dessa natureza. Para solucionar este problema, o presidente do Comitê Nacional Judicial de Enfrentamento à Exploração do Trabalho em Condição Análoga à de Escravo e ao Tráfico de Pessoas, conselheiro Lelio Bentes, propôs a criação de um grupo de trabalho para discutir no âmbito do comitê soluções tecnológicas que permitam que os sistemas dos diferentes órgãos dialoguem entre si.

Representantes das áreas da tecnologia da informação (TI) dos órgãos que integram o comitê vão discutir como tornar seus sistemas próprios compatíveis com o Modelo Nacional de Interoperabilidade (MNI), plataforma que permite a comunicação pela internet entre sistemas de tramitação processual utilizados por órgãos do Poder Judiciário e outras entidades que compõem o sistema de justiça. “A troca de informações nesse encontro justifica plenamente a realização dessa reunião do Comitê Nacional Judicial de Enfrentamento à Exploração do Trabalho em Condição Análoga à de Escravo e ao Tráfico de Pessoas”, afirmou o conselheiro Lelio Bentes.

Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias

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